Quando ainda era adolescente me aconteceu um fato marcante. Tão marcante que até hoje quando lembro sinto o peito apertar e me emociono.
Hoje foi assim. Lembrei-me do meu avô. Lembrei-me daquele dia.
Passeava eu com meu avô num fim de tarde. O sol, já querendo se pôr, ainda nos esquentava o corpo.
E depois descobri que a alma também.
Meu avô já tinha idade avançada e suas pernas começavam a lhe faltar. Precisava de alguém que o acompanhasse nas breves saídas à rua. Aquele passeio era uma oportunidade de vislumbrar o lado de fora de casa, arejar a "cuca", ver outras cores. A tarde estava linda naquela superquadra superarborizada de Brasília. Já tínhamos conversado e naquele momento apenas contemplávamos o caminho. Foi quando passou um outro senhor por nós. Um senhor como meu avô. Idoso, com dificuldade de andar, mas, infelizmente e provavelmente procurando naqueles raios de sol um calor que não experimentava em família.
É, ele andava só. Com dificuldade até para falar. Mas falou. Fomos interpelados por ele e paramos. Ele literalmente bateu palmas para o que viu e disse que feliz e completo era meu avô porque tinha alguém que podia lhe dar o braço e o afeto naquele momento. Meu coração sangra só de lembrar. Seus olhinhos miúdos encheram d'água. Os meus também. Sim, ele estava solitário, magoado, triste mesmo.
Fico pensando o quanto é difícil envelhecer. Ver nosso vigor físico ficando para trás, nossas capacidades se extinguindo, vendo um futuro sem futuro e queimando no peito tantas vontades ainda.
Depois do acontecido, olhei nos olhos do meu avô e lhe disse que feliz era eu por ser depositária da confiança dele em me dar os braços.
Hoje estava andando num fim de tarde numa superquadra superaborizada de Brasília e me voltou à cabeça o acontecido. Revivi por momentos.
Meu avô e aquele senhor hoje estão muito melhores que nós, creio eu.
E a lição daquele pequeno fragmento da vida deles, num encontro não marcado num fim de tarde, eu levo pra toda a vida.